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Mostrando postagens de maio, 2025

SONETOS "CÍRCULO VICIOSO" E "À CAROLINA" - MACHADO DE ASSIS

  CÍRCULO VICIOSO Bailando no ar, gemia inquieto vaga-lume: — “Quem me dera que fosse aquela loura estrela, Que arde no eterno azul, como uma eterna vela!” Mas a estrela, fitando a lua, com ciúme: — “Pudesse eu copiar o transparente lume, Que, da grega coluna à gótica janela, Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela!” Mas a lua, fitando o sol, com azedume: — “Mísera! tivesse eu aquela enorme, aquela Claridade imortal, que toda a luz resume!” Mas o sol, inclinando a rútila capela: — “Pesa-me esta brilhante auréola de nume… Enfara-me esta azul e desmedida umbela… Por que não nasci eu um simples vaga-lume?” À CAROLINA Querida, ao pé do leito derradeiro Em que descansas dessa longa vida, Aqui venho e virei, pobre querida, Trazer-te o coração do companheiro. Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro Que, a despeito de toda a humana lida, Fez a nossa existência apetecida E num recanto pôs um mundo inteiro. Trago-te flores, - restos arrancados Da terra que nos viu passar unidos E ora mortos n...

POEMA "O SENTIMENTO DUM OCIDENTAL" - CESÁRIO VERDE

  O SENTIMENTO DUM OCIDENTAL                                                   A Guerra Junqueiro I - AVE-MARIA        Nas nossas ruas, ao anoitecer, Há tal soturnidade, há tal melancolia, Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.        O céu parece baixo e de neblina, O gás extravasado enjoa-me, perturba; E os edifícios, com as chaminés, e a turba Toldam-se duma cor monótona e londrina.        Batem os carros de aluguer, ao fundo, Levando à via-férrea os que se vão. Felizes! Ocorrem-me em revista exposições, países: Madri, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!        Semelham-se a gaiolas, com viveiros, As edificações somente emadeiradas: Como morcegos, ao cair das badaladas, Saltam de viga em...

POEMA "A UM POETA" - ANTERO DE QUENTAL

  Tu que dormes, espírito sereno, Posto à sombra dos cedros seculares, Como um levita à sombra dos altares, Longe da luta e do fragor terreno. Acorda! É tempo! O sol, já alto e pleno Afugentou as larvas tumulares... Para surgir do seio desses mares Um mundo novo espera só um aceno... Escuta! É a grande voz das multidões! São teus irmãos, que se erguem! São canções... Mas de guerra... e são vozes de rebate! Ergue-te, pois, soldado do Futuro, E dos raios de luz do sonho puro, Sonhador, faze espada de combate!